Antes de ler sobre esta história, que tal colocar para tocar a música “Diversidade”, do cantor e compositor Lenine? Focando no trecho – “se foi pra diferenciar, que Deus criou a diferença, que irá nos aproximar, intuir o que Ele pensa, se cada ser é só um e cada um com sua crença” –, podemos perceber a importância do diferente ao nosso redor e como conhecê-lo nos faz refletir sobre as diversas formas de expressões religiosas, crenças e tradições. Pensando nisso e dando continuidade à série de reportagens “Juventudes e Religiosidade”, o Humanismo Caboclo foi conhecer o templo Onã, ligado à doutrina espírita Vale do Amanhecer, localizado na cidade de Nazária, a 30 quilômetros da capital piauiense, Teresina.
Considerado um templo pequeno pela quantidade de trabalhos que realiza, o templo Onã é cercado de cores fortes em suas paredes, nas vestimentas de seu povo e nos olhares de quem vai visitá-lo. É um local cujo aroma da pedra Amesclar percorre por todo ambiente e, sob seu perfume, acontecem as atividades que a doutrina dispõe.
A doutrina do Vale do Amanhecer, ainda desconhecida por muitos, é cercada por uma combinação de diversos elementos culturais, religiosos e princípios regidos com base no amor e perdão. Nesta comunidade religiosa tem-se como convicção a reencarnação, a incorporação de espíritos por médiuns, manipulação de energias em todos os rituais e trabalhos para a cura espiritual. Todos estes trabalhos são oferecidos de forma gratuita para quem almeja ou necessita vivenciar. São experiências (como repórter e participante) que fazem o ser humano repensar em tudo que o cerca e acredita.
De acordo com o presidente adjunto José Eugênio de Carvalho, a religião não se opõe aos saberes e conhecimentos científicos e afirma que ambos precisam um do outro para o desenvolvimento da doutrina. “Nós trabalhamos juntamente com a ciência, pois não criticamos nem a condenamos, muito pelo contrário. Na doutrina do Amanhecer os dois caminham juntos, fé e ciência, por isso que tem essas duas cores aqui” – disse olhando para a faixa em volta do seu corpo. E continuou: “o lilás representa a fé e o amarelo a ciência, certo? Então trabalhamos em conjunto. Então a questão do nosso desenvolvimento é neste sentido”, completou.
Os atendimentos à população são feitos aos domingos a partir das 15h, onde os interessados e quem frequenta a casa se cumprimentam com “Salve Deus”, uma saudação que pode ser considerada um pedido de licença para entrar ou sair de um lugar ou também um pedido de proteção. Todos os momentos dentro da casa são acompanhados pelos responsáveis que integram o quadro de seguidores da doutrina. Eles têm a missão de resguardar e manter o templo financeiramente, pois não aceitam doações para as atividades realizadas na área. Como também possuem divisão de tarefas para a continuidade dos trabalhos.
Onã dispõe para a comunidade cinco trabalhos. São eles: tronos, cura evangélica, defumação, linha de passe e mesa evangélica. Cada um com seu papel e intuito de realizar uma limpeza espiritual no paciente e fazê-lo seguir em frente com a sua aura purificada.
O templo do Vale do Amanhecer de Nazária possui cinco anos de fundação e é regido pelo ministro Onã onde o adjunto, com a missão de formar o seu povo, tem a missão de representá-lo no plano físico. Segundo o Portal Oficial dos Templos do Vale do Amanhecer, o local faz parte dos 19 templos ativos no Piauí e dos 712 em todo o país. “Nós temos templos em toda a América Latina e em alguns países da Europa como Portugal, Espanha, Estados Unidos. Então a doutrina se espalhou, mas ainda tem muito o que buscar, tem muito aonde chegar ainda. Acredito que ainda vai se expandir para o resto do mundo todinho”, disse José Eugênio de Carvalho.
Além disso, há uma juventude que se envolve nas ações da doutrina. Dentre estes jovens estão o estudante de técnico em Farmácia, João Vitor Prado e a estudante de técnico em Administração, Maria Clara Prado. Irmãos, que além da linhagem sanguínea partilhada, possuem outro elo: a fé. Ambos começaram a prática na doutrina com oito anos, levados por familiares, principalmente pela sua avó Maria do Carmo Prado, que já fazia parte da religião espírita kardecista.
Os dois participam do trabalho chamado Pequenos Pajés, do projeto Casa Grande, voltado para as crianças e jovens que frequentam o Vale. Nesta iniciativa há ensinamentos bíblicos e ações que os entretem até o início das atividades do ambiente. “Temos como responsabilidade passar os ensinamentos de Jesus. Neste projeto, temos a manipulação da energia e a parte bíblica com a leitura do Evangelho, com as orações e também tem a parte de diversão. Procuramos dar assistência para que sejam cidadãos e que consigam enxergar as armadilhas do mundo que têm lá fora. Então preparamos o cidadão para o amanhã”, ressaltou o presidente sobre o projeto.
João Vitor e Maria Clara são médiuns de incorporação, mas ainda não realizam atendimentos ao público por serem menores de idade: a doutrina rege que somente maiores de 18 anos façam parte oficialmente dos rituais desempenhados na casa. Enquanto isso, participam de outros ritos no Vale, aperfeiçoando suas práticas e estudos sobre a sua crença. Como é o caso de Maria que, com 17 anos, prepara-se para a chegada da maioridade com aulas sobre a conduta a ser seguida como médium. “Eu não me sentia pronta, mas estou ao máximo tentando aprender para melhorar. É como se fosse uma preparação pra você receber aquelas forças e seguir em frente”, disse.
São nessas aulas que tiram dúvidas sobre as realizações do Vale do Amanhecer e até questionamentos juvenis como o fato de não poderem ter contato com bebidas alcoólicas e outros vícios. “Além da nossa conduta como médium, tiramos as nossas dúvidas sobre algum trabalho da casa que a gente ainda não fez e nos explicam. Como devemos agir ou então, por exemplo, perguntamos: ‘por que não podemos beber?’ Tipo essas perguntas”, disse João Vitor. E respondendo o seu questionamento, ele responde: “porque você bebendo, você tá fazendo mal pro seu corpo, poluindo ele. Se for médium de incorporação, como você pode curar uma pessoa sendo que o seu corpo está doente?”, arremata o jovem.
Dentre as únicas exigências que a doutrina do Vale do Amanhecer, uma orienta que seus adeptos não usufruam de drogas. “Para nós é uma forma de suicídio, o álcool e o cigarro. Porque antes de vir para Terra, todos nós passamos por uma preparação para a gente vir e acreditamos nisso. Nessa preparação combinamos todas as coisas que vamos fazer aqui na Terra para conseguirmos subir cada vez mais e evoluir. E as drogas fazem o contrário”, comentou João.
Os jovens ainda comentam como é a relação e como convivem com seus amigos e as restrições que a religião possui. “Eles sabem que não bebo, não fumo, então peço que não me ofereçam e eles não me oferecem. Eles bebem, até já fui em festas e todos na mesa estavam bebendo e eu estava com meu refrigerante de boas, ninguém me ofereceu. É bom termos amigos que são diferentes da gente em questão de mentalidade sobre isso e doutrina, mas eles entendem, respeitam e concordam com alguns pontos. Alguns acabam se interessando em saber como é a religião, pois acaba sendo algo diferente e o diferente, às vezes, chama atenção. Então, chega muita gente para conversar comigo, perguntar experiências e respondo. Tentamos explicar ao máximo nossas experiências e a nossa forma de crer de uma forma que as pessoas possam entender, porque sempre levam pro lado da macumba, da Umbanda, e sempre pensam que é o mal. O que é totalmente diferente do que está enraizado. O preconceito”, afirmou Maria Clara.
Maria Clara ainda comenta sobre sua fase afastada do Vale do Amanhecer por questionamentos internos sobre a religião e suas restrições. “Tive uma fase bem rebelde da minha vida, pois achava que a doutrina me prendia muito, sabe? ‘Ah, eu não posso beber, não posso sair com meus amigos, como é que vou me divertir?’ Para nós jovens, muitas vezes achamos que só bebida é diversão, mas não. Atualmente, acredito que só da gente estar entre os amigos, já é um motivo para se sentir feliz e se sentir livre. Apesar desse tempo afastada, nunca bebi, só pensava que se passasse um tempo afastada eu poderia me libertar, mas não. A minha ligação com a doutrina foi mais forte”, disse. Enquanto João Vitor comentou: “me sinto totalmente livre para fazer o que eu quiser, por exemplo, sou um adolescente normal, vivo minha vida normal. Saio daqui do Vale, lá para fora e me considero um adolescente normal. Quem me vê assim não imagina nada”, afirmou.
“Mesmo com todos nossos anseios, os nossos pais dão muitos conselhos para a gente como, por exemplo, quando estamos meio cabisbaixos e sem querer vir, eles falam: ‘Olha, se você não quiser mais fazer parte, você diz, você pode escolher qualquer outra religião’. O que dizem muito para a gente é que não podemos viver no mundo sem religião e que podemos escolher qualquer uma”, disse Maria Clara sobre a relação dos seus pais em referência aos seus anseios e dúvidas a respeito de sua crença.
Todos os dias os jovens realizam suas orações em horários específicos do dia: às 12h, 15h e às 20h. “Fazemos umas preces, a mesma prece em todos os horários, que é o momento que todas as pessoas que fazem parte da casa de todas as regiões estão fazendo a mesma prece, como se a gente fizesse uma corrente de oração”, comentou João Vitor.
Quando questionados sobre a importância da juventude frente aos movimentos religiosos, eles conversam entre si e chegam à conclusão de que “é muito importante os jovens estarem em meio aos movimentos, pois precisam/precisamos ter uma religião para se firmar no mundo. Principalmente neste ano tão catastrófico, então é bom a gente ter um rumo, algo a seguir, sabe? Por isso que valorizamos e confiamos na autenticidade das mensagens e a veracidade em tudo que elas nos dizem, em tudo que os espíritos nos passam. É acreditar, confiar e seguir nos ensinamentos que nos são dados”, finalizam. Por Maria Clara Morais
Salve Deus!
Um conteúdo Básico e muito rico de nossa Doutrina, Parabéns.